terça-feira, 29 de maio de 2012
Amusical
Possuo,
como muitos, uma bela porção de medos montados sobre mim. Em um quarto escuro,
na varanda, no jardim, sobretudo é o medo do fim. Caso morra, que roupa devo
usar? Vai ficar tudo lá espalhado, me
pergunto quem irá arrumar? E têm meus livros, eu, a Frida, a vida. Vou perceber
que morri enfim? Não tenho medo de abelhas. Não devem elas ter medo de mim.
O
que assusta, o que me cerca é a morte certa incerta. É a morte num susto, num
pulo, lenta e pestilenta, é a certeza de que ela vem me buscar. Não há nada que
se salve, que não se dissolve, na passagem dos ventos, no contar dos tempos, no
findar dos anos. E os planos? Os planos, você trate de correr. Somos pequeninos,
eternos meninos nos milhares de anos. É necessário sair de casa preparada para
nunca mais voltar?
Sentada
em frente a singela janela, posso vê-la, as suas visitas a pessoas estranhas,
tantas pessoas estranhas que, no entanto, eu no fim decerto vou encontrar. Um
lugar invisível, ideia risível, porém nada mais sensato do que em algo esperar.
Você sonha com belas carruagens? Pode ser que em sua última viagem uma delas
venha especialmente tão somente te achar.
E
como encarar essa carona, de um cocheiro mórbido, calar-se frente ao sonho
findo, e caso se morra dormindo, é pior então, nada, nada espiar? Nada ver, nem
mover, nem vestir, nem despir, separar ou unir. E não há nada que se coloque
nos lábios, nem folha, nem bolha que vai te salvar. Você tem medo de mim? Por favor,
não tenha medo de mim.
É
nesse intervalo entre o nascer e morrer que devo construir meus anos? O que
toca esse tambor que soa tão longe e nos chama? É como ir para cama. Morrer é
descansar? Entre milhões de planetas, asteroides
e cometas, existe alguém que nos ama?
Largaram-nos
aqui com um bauzinho de dons, um vestido de festa e um beijo na testa. Estamos
todas perdidas, meninas... nada, nada irá nos salvar...
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Imagem: John William Waterhouse
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